quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Falar x Escrever


Lembro que Lispector escreveu - o gato comeu minha língua, mas não minha caligrafia

e não é que fiz minhas as palavras dela!

escrever é fácil; tu tens uma idéia, pensas, desenvolves ela e, só depois disso, tu te atreves a tornar público.. repito, escrever é fácil.
mas falar... a palavra, uma vez fora da boca, não volta nunca mais - não dá para apagar, rasgar ou botar fora!
falar é difícil, e muito! as palavras ditas transportam tanta coisa (sentimentos, pensamentos, desejos e ideais) é de inteira responsabilidade do falante os efeitos causados em seus ouvintes... é a palavra pela própria palavra...
#se as usaste para ofender alguém, por exemplo, use-as para convencer essa pessoa a te desculpar;
#se as usaste para dizer que merecias o amor de alguém para sempre, tenta explicar a esta pessoa, com palavras, o porque de a estares abandonando agora;
#se usaste as palavras para dizer que temos que ajudar o próximo, porque ser tão incoerente ao dizer -não ao menino que pede para comprares os imãs de geladeira que a mãe dele fez..
será que é tão fácil usar a fala? acho que não, mas é necessário, afinal se o menino dos imãs ficasse te esperando bolar uma boa resposta para a negativa ao pedido dele, o guri morreria de fome. Não estou questionando a veracidade de todas as nossas palavras... afinal, seria um assunto sem fim mesmo!
Só estou dizendo (na verdade, pensando, organizando e escrevendo) que falar é difícil, é responsabilidade demais...

numa relação "por um fio", não discutam mais, se já viram que as palavras não adiantaram, saíram impensadamente, magoaram, estavam carregadas de incertezas, acabaram piorando tudo ... mandem cartas, pensem o que querem que o outro saiba, "decidam" as coisas ruins que precisam ser ditas e codifiquem, utilizando os eufemismos e tudo acabará bem... mesmo que acabe de verdade!
as palavras ditas e ouvidas nos marcam, afinal, quem não lembra as palavras que usou pra se declarar a alguém há anos atrás, ou as palavras que ouviu em tom de crítica... que até te fizeram parar, pensar e rever teu comportamento e tua postura diante de certas situações - quem sabe, além das tuas observações, as palavras que ouviste ao longo da tua vida formaram o que és hoje.

só de uma coisa não tenho dúvida..a fala é espontânea, e a escrita premeditada...portanto, acredito que a fala seja sincera, o que te ocorreu no momento, a verdade nua e crua (que clichê!) o que não deu pra se segurar, escapou-se da boca, ou seja, não deu tempo de inventar nada melhor. Já a escrita é o que tu pensaste, reviste, achaste melhor não botar isso ou aquilo, perdem-se ideias porque quisemos colocá-las no papel na ordem em que nos ocorreram, e nem pensamos que o pensamento é muito mais rápido que as mãos.

Como eu queria poder falar, mas não consigo, não sai... todos os meus pensamentos ficam em mim, ou no papel... ao vento jamais! A escrita, ainda que pareça besteira, escravizou-me... viciou-me.. sinto que devo escrever ao ir dormir, ao acordar, ao presenciar qualquer coisa - por normal que seja... é triste as vezes. As vezes, tem-se tanto a dizer... e não se consegue!

Faz muito tempo que o gato comeu minha língua... e o que me restou??

Escrever e escrever... cansativamente e sem parar...
escrever um cartão em vez de parabenizar pessoalmente;
escrever uma carta pra terminar uma relação;
escrever que alguém me magoou em vez de dizer à passoa a fim de acertar os mal-entendidos;
escrever... só escrever, sem mover os lábios, gestualizar, gaguejar..nada! só escrever...

-gato danado, devolva minha língua... estou farta de pensar... quero ser um pouco espontânea também..

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