quinta-feira, 23 de junho de 2011

Foi de parto normal

Finalmente, terminei o trabalho de Filosofia sobre a Felicidade e a amizade, na visão aristotélica. Na verdade, o problema foi começar, depois do primeiro parágrafo, tudo é mais fácil.

Bueno, como é um assunto de estudo, mas também tem muito de mim, resolvi pôr neste blog também.




A SENSATEZ DE ARISTÓTELES:
SOBRE A FELICIDADE E A AMIZADE

“[...] Entretanto, em qualquer lugar, reduzidos a nós mesmos, nós é que fazemos ou encontramos a própria felicidade.” (Oliver Godsmith)

Para que falemos dos conceitos de amizade e felicidade do filósofo grego, é imprescindível que recorramos a sua obra Ética a Nicômaco. Nesta obra – que é composta de dez livros – o autor fala das ciências, da política, do prazer, etc., e também do motivo de ser deste texto: amizade e felicidade.
Antes de entrarmos na obra de Aristóteles propriamente dita, é pertinente trazermos para esta conversa um texto de Schopenhauer, intitulado Aforismos para a sabedoria na vida, mais especificamente, os dois primeiros capítulos, nos quais o autor fala sobre o livro Ética a Nicômaco, no que se refere à divisão dos bens humanos em exteriores, da alma e do corpo. Schopenhauer reduz essas três classes ao que ele chama de “três determinantes básicas”: aquilo que se é; aquilo que se tem; e aquilo que se representa.
Diz Schopenhauer que a felicidade depende unicamente daquilo que se é e, o mais interessante e carregado de sentido: se não nos sentimos felizes com o que somos, acreditamos que poderemos alcançar a felicidade com o que temos (riqueza) ou com o que representamos (posição ou status), aí residiria o fato de os abastados serem, muitas vezes, mais infelizes que os que quase nada de material têm ou que aqueles que têm uma posição desejada, mas que não lhes satisfaz enquanto humanos.
De acordo com Schopenhauer,

“Para a nossa felicidade na vida, aquilo que somos, isto é, a nossa personalidade, é o fator primordial e básico, já por ser constante e operar em todas as circunstâncias, já porque não estando sujeita ao destino, como os outros dois títulos (o que se tem e o que se representa), não nos pode ser arrebatada.” (p. 26)

Como podemos observar, a sabedoria deste autor não é partilhada por todos, uma vez que sempre haverá aqueles que, buscando a felicidade perene, limitam-se a juntar riquezas, e acabam – no fim da vida – a questionar-se por que, tendo de tudo, não foram felizes. Passaram a vida, a cometer todo tipo de excessos, e a encontrar a falsa felicidade, aquela momentânea que não adveio do caráter ou da personalidade, mas do desespero por senti-la, ainda que de maneira efêmera.
Stefan Klein, em A fórmula da felicidade também cita Aristóteles: “Felicidade é consequência de uma atitude". Se usarmos nosso potencial da melhor maneira que nos seja possível, o resultado será a felicidade. Para Klein, a infelicidade não precisa de estímulo, ela simplesmente aparece, sem convite. Por outro lado, a felicidade é como um amor, precisa ser conquistada. Não adianta somente pensar nela, deve-se correr atrás e mostrar o seu melhor para alcançá-la. Os gramáticos poderiam passar horar pensando no fato de um simples prefixo mudar tudo...

A MÁSCARA DA (IN)FELICIDADE

Não raro encontramos pessoas a invejar a felicidade aparente de outras. A inveja (ou a invejosa) parece pensar que a felicidade escolheu todos em volta dela, excluindo-a. Mas a inveja não percebe que ela própria é o contrário da felicidade, ela é o amargo. O ividioso é capaz de invejar até mesmo o menos afortunado que ele, simplesmente porque o que ele é não lhe basta, poderia ser feliz somente se tivesse o que é do outro ou, ainda, se o outro não tivesse o que ele também não tem.
No entanto, a inveja é traiçoeira até mesmo com quem a sente, pois, ao alcançar o que era do outro, a felicidade dará um passo maior, se distanciando ainda mais. Mais uma vez, temos que admitir que Aristóteles está certo: Se o que somos não nos basta para sermos felizes, tampouco nos bastará o que tivermos ou o que representarmos para os outros.
Discutamos usando como base a frase “os fins justificam os meios”. Para a felicidade, por exemplo, isso não se aplica. Justamente porque a felicidade também depende dos meios e, para o Estagirita, se estes não forem virtuosos, o fim (a felicidade) não chegará.

A AMIZADE E A FELICIDADE
Porque sem amigos, ninguém escolheria viver, ainda que possuísse todos os outros bens.” (Aristóteles)

Primeiramente, vimos que a felicidade depende unicamente daquilo que se é. E a amizade, de que depende? Ao falar de amizade, em Ética a Nicômaco, Aristóteles primeiro traz opiniões de outros filósofos gregos, a fim de discutir se a amizade se dá entre os semelhantes ou entre os diferentes. No L. VIII, cap.2, o autor questiona se “os homens amam, então, o que é bom em si ou o que é bom para eles?”
Em Ética a Nicômaco, Aristóteles diferencia a amizade em três tipos: a que se baseia na utilidade mútua (em virtude do que recebem um do outro), a que se baseia no prazer mútuo e a amizade entre homens bons de virtude. Às primeira duas o filósofo chama de curtas, uma vez que, quando a amizade deixa de ser útil ou prazerosa para uma das partes, acaba. No entanto, a terceira é a amizade duradoura, perfeita, trás benefícios, mas é difícil de encontrar.
Respondendo a questão proposta, poder-se-ia dizer que os homens que amam o que é bom em si têm amizades baseadas na virtude e os que amam o que é bom para si têm amizades baseadas na utilidade ou no prazer e, neste caso, e somente neste, poderia haver amizades entre os maus.
Antes de classificar a amizade, o filósofo fala de amor e benevolência. A benevolência seria o sentimento de amizade unilateral. A amizade propriamente dita, segundo Aristóteles, presume a reciprocidade. Não há como ter um amigo sem igualmente ser amigo. Por outro lado, o amor pode perfeitamente (mas não felizmente) ser unilateral, uma vez que se pode amar coisas ou pessoas sem que dependa do sentimento recíproco.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode ser que, quando digamos a alguém que necessitamos fazer um trabalho acadêmico no qual tenhamos que discorrer sobre felicidade e amizade, as pessoas pensem tratar-se de algo fácil. Mas que se ponham diante do papel e comecem. As reticências se espalham pelo ar e começamos a questionar sobre a própria felicidade, afinal, não se pode escrever sobre aquilo que não se tem certeza de ser (ou de não ser).
Presumi, num primeiro momento, que os que disseram ser fácil escrever sobre felicidade fossem felizes, uma vez que só precisariam descrever o que sentiam. Mas uma reflexão mais profunda fez-me pensar se estes que a jugam “fácil” não seriam justamente os que Aristóteles diz que valorizam o exterior mais que o interior, ou seja, os que acreditam que a felicidade consista e ter coisas ou representar algo, antes de ser alguém virtuoso. Porque só assim falar de felicidade seria fácil.
A obra Ética a Nicômaco, especialmente os livros VIII e IX, não se baseia em pesadas teorias, bem como não é uma leitura pesada, ao contrário, parece ter nascido da simples observação da conduta humana, da moral, de tudo o que rodeia um indivíduo e suas paixões. Mas observar a conduta humana não serviria para muito se o observador fosse desprovido der sensibilidade.
O que Aristóteles faz é discursar sobre o subjetivo de maneira objetiva. Não expressando sua opinião como um imperativo, mas como algo que é o bem maior, porque aquilo que provém das virtudes só pode ser superior àquilo que vem do prazer ou da utilidade. Ao passo que a felicidade consiste, segundo Aristóteles, em uma atividade virtuosa, a amizade verdadeira consiste em uma relação entre homens virtuosos.

REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução: Leonel Vallandro e Ger Bornheim. São Paulo: Abril, 1979.
KLEIN, Stefan. A fórmula da felicidade. Tradução: Kristina Michahelles. – Rio de Janeiro: Sextante, 2005.
SCHOPENHAUER, Arthur. Aforismos para a sabedoria da vida. Tradução: Genésio de Almeida Moura. 3º ed. ?. Melhoramentos, ?.

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